10 de abril de 2010

Peraltagem


Tela "Dançando ao Vento" , Martha Barros

O canto distante da seriema encompridava a tarde.
E porque a tarde ficasse mais comprida a gente
sumia dentro dela.
E quando o grito da mãe nos alcançava a gente
já estava do outro lado do rio.
O pai nos chamou pelo berrante.
Na volta fomos encostando pelas paredes da casa pé
ante pé.
Com receio de um carão do pai.
Logo a tosse do vô acordou o silêncio da casa.
Mas não apanhamos nem.
E nem levamos carão nem.
A mãe só que falou que eu iria viver leso
fazendo só essas coisas.
O pai completou: ele precisa de ver outras
coisas além de ficar ouvindo só o canto dos
pássaros.
E a mãe disse mais: esse menino vai passar
a vida enfiando água no espeto!
Foi quase.

Manoel de Barros
Memórias Inventadas- A Terceira Infância

Um comentário:

Ceci disse...

oi, que lindo poemar, tantas bonitas lembranças. abraços, com silencios e tosses e acordar...